Gestão de Riscos e Gestão de
Crises: como essas práticas podem ajudar as pequenas e médias
organizações a maximizar performance, em períodos voláteis
por Henrique Oliveira*
O ano de 2020 iniciou com uma série
de dissabores na vida dos mineiros. Entre o Natal e o Ano Novo, lotes de
cerveja, da principal microcervejaria do estado, contaminou dezenas de
consumidores, causado danos à saúde e fatalidades. O caso se encontra sob
investigação pela Polícia Civil e outros agentes regulatórios. Ainda não se
sabe as causas do ocorrido. Práticas de sabotagem é uma das hipóteses. Em
consequência disto, o setor cervejeiro de Minas Gerais está trabalhando
fortemente em sua defesa, esclarecendo dúvidas e acalmando o consumidor. Em 19
de janeiro, um temporal torrencial na Capital mineira chegou a registrar 180
milímetros de acúmulo de águas, em um período de apenas três horas. Os resultados
foram diversas ruas alagadas e avenidas interditadas. O comércio em geral,
escolas e algumas industrias foram afetados. Casas foram degradadas por
desabamentos, gerando mortes, desaparecidos ou ainda desabrigados. A Prefeitura
está autuando em obras de contenção de forma urgente, sem licitação, dado
tamanha gravidade. Outras regiões de Minas também sofreram com as chuvas. O Governo
do Estado de Minas Gerais decretou “Situação de Emergência” em 47 municípios e interviu
oferecendo estrutura, incentivos fiscais e recursos financeiros, na ordem de 90
milhões de Reais. No atual cenário, não há condições de executar um plano
estratégico de curto prazo, pois o clima não ajuda.
Alguns
diriam que esses eventos ocorreram por casualidade; outros não. Independentemente
qual for a dedução, torna-se importante, (e muitas vezes imprescindível),
pensar fora da caixa ou ainda refletir sobre eventos que, em caso de ocorrência,
quais seriam as consequências e como respondê-las de forma controlada, eficaz e
eficiente. A não implementação ou a ausência de controle, sobretudo aqueles que
miram combater cenários caóticos, ou de alta criticidade, deixa indivíduos
confusos e atordoados no momento em que o impacto ocorre. Nesse estado de
tontura, a imagem e a reputação da organização e de seus envolvidos ficam vulneráveis
e inevitavelmente expostos.
É nesse contexto, pensar em danos e em danosidades,
que os gerenciamentos de riscos e de crises devem ser tratados com seriedade de
forma a se tornarem um hábito nas organizações que venham atingir níveis de maioridade
ou ainda representatividade coletiva relevante. Empresas pequenas, ao se
tornarem maduras, devem pensar cada vez mais em desvios de objetivos e em respectivas
soluções, firmando-as no papel, como se fosse um manual de instruções a ser
constantemente lido, relido, testado e reavaliado.
Segundo a Pesquisa de Maturidade de riscos da
KPMG, realizada em 2018, 56% das organizações apresentam um baixo nível de
maturidade em relação ao tema; 14% são empresas que faturam até R$ 49 milhões.
Se somarmos as empresas que faturam até R$ 99 milhões, o índice atinge o
patamar de 20%. O Global Risk Management
Survey Report da Companhia de Seguros Aon, do ano de 2019, aponta que, as
frequências de envolvimento e os níveis dos riscos estão se escalonando de
forma tão rápida que soluções de gestão de riscos não são ainda mais rápidas o
bastante para prevenir ou mitigar perdas. Para quem não está preparado, ambos
diagnósticos são preocupantes.
É importante frisar que Gestão de Riscos se trata de um sistema integrado às organizações que reúne uma série de procedimentos que definem como o negócio e suas funções transversais podem reportar riscos que devem ser gerenciados e monitorados, por meio da sua identificação, mensuração e fluxo de comunicação, num processo contínuo, que deve incluir desde o dono do risco até o mais alto escalão hierárquico, ou seja, a Direção Executiva e, quando existente, o Conselho de Administração. Nesse cenário, deve-se haver uma padronização de processos, com terminologia comum, métricas e trocas de experiências e melhores práticas, de forma a encorajar a produção de um reporte de riscos previamente dialogado e interativo entre os donos de riscos e os provedores de controles, visando os duelos entre risco versus tratamento do risco; risco versus objetivos, riscos versus oportunidades; riscos versus estratégia e tomada de decisão. Praticar o exercício contínuo da gestão de riscos, prepara o público relacionado a pensar mais sobre incertezas. Em contrapartida, esse mesmo exercício aumenta o grau de instrução e percepção de como tomar riscos, transformando alguns desses em oportunidades.
Paralelamente, a Gestão de Crises é recorrida,
a partir do momento em que o Gerenciamento de Riscos apresenta falhas,
ultrapassa o apetite da organização ou ainda atinge níveis de risco acima do
tolerável. Gestão de Crises visa salvaguardar a integridade física de pessoas e
não em recuperar empresas. É direcionada aos agentes que irão atuar para que
eventos não se propaguem ou alcancem níveis ainda mais críticos. É uma forma de
evitar que um desastre, (ou uma série desses), se transforme em catástrofe.
Neste sentido, atuar em cenários de crise requer preparação de times
multidisciplinares formados por agentes internos e externos a organização. Flávio
Godinho, Tenente Coronel Adjunto da Defesa Civil de Minas Gerais relata, em
palestra ministrada em torno do atendimento às emergências em barragens e
simulados à vida que, para obter eficácia das equipes de salvamento, torna-se
necessário a formalização de um Plano de Atendimento a Emergências (PAE) em
três níveis de riscos e priorização, em formato de quadro esquemático, com
fotos e de fácil leitura. Deve-se incluir senso estatístico e contatos de
agentes (e de seus back-ups) que farão parte do time de crises, incluindo seus
dados pessoais. Equipes de Saúde e Segurança, Meio Ambiente, Diretorias, Corpo
de Bombeiros, Hospitais, SAMU, Agências, Defesa Civil e Polícia Militar, são
parte inerente deste grupo. Deve-se haver estrutura física, (uma verdadeira “Sala
de Guerra”), devidamente equipada com rádios, celulares, sirenes e roupas de
combate adequados. Em conjunto, deve-se apresentar um plano de comunicação de
crises acessível, rápido e transparente, capaz de orientar o público em geral,
além de demonstrar a evolução dos resultados dos planos de contenção e resgate.
Adicionalmente, praticar exercícios simulados de evacuação e sobrevivência com
o público alvo, sejam estes funcionários e a comunidade como um todo, é
fundamental. A prática ajusta a cultura de segurança e aguça o alerta, onde
indivíduos aprimoraram o raciocínio, tornando-o em memorização e em seguida em
hábito.
Hábito. A busca incansável por bons hábitos.
Talvez seja esse o gatilho que está faltando nas organizações, para que estas possam
sair da turbulência caótica e concluir seus longos voos de forma mais assertiva
e segura. É essencial almejar a implantação efetiva de uma cultura de Gestão de
Riscos e de Crises coerente aos desafios da atualidade, independentemente se
esta organização pertence ao poder público ou privado. Avançar nestes dois
temas é urgente.
À cervejaria mineira, funcionários e vítimas a
nossa solidariedade, e que superem este momento tão difícil e desastroso. Às
prefeituras de Belo Horizonte e demais municípios de Minas afetados idem.
Os 10 maiores riscos, segundo a pesquisa
mundial AON:
Fontes: AON Survey Report:
https://www.aon.com/2019-top-global-risks-management-economics-geopolitics-brand-damage-insights/index.html?utm_source=aoncom&utm_medium=2017-grms-popup&utm_campaign=grms2019
KPMG Maturidade de Riscos: https://assets.kpmg/content/dam/kpmg/br/pdf/2018/07/br-pesquisa-maturidade-de-riscos-2018.pdf
* Henrique
Oliveira, é Gestor de Governança, Riscos e Compliance.