Revolução cervejeira em Minas
Por Wilson Renato Pereira, Jornalista, Psicólogo e Psicanalista –
Eles foram aparecendo aos poucos, trocaram confidências na noite belorizontina e descobriram que tinham os mesmos ideais. Em pouco tempo, seus sonhos se tornaram realidade e, após muita luta, os novos revolucionários mineiros conquistaram o mundo…da cerveja, ganhando importantes prêmios nacionais e vencendo concursos internacionais para o Brasil.
A saga desse bravo pessoal começou há mais de dez anos e agora está sendo registrada em livro que será lançado pela editora Autêntica. Além de revolucionário de primeira hora, proprietário da cerveja “Ave Cesar” e ex-presidente da Associação dos Cervejeiros Artesanais Mineiros (Acerva) o autor, Henrique Oliveira, é escritor, formado em Ciências Contábeis e gestor de governança, riscos e compliance da Belgo Bekaert Arames.
O grupo que iniciou o movimento era formado por amantes da cerveja de qualidade e a maioria residia em Belo Horizonte. Entre eles, Rodrigo Lemos, Rômulo Gresta, José Augusto Silveira, Danilo Leite Mendes, Thomas Karpens, Daniel Gontijo “Draghenvaard”, Pablo Carvalho, Paulo Patrus, Gabriela Montandon, Marco Falcone, Luiz Flávio Leão, Daniel Pinheiro, Felipe Viegas e o mestre cervejeiro Paulo Schiaveto. Nas suas inconfidências, trocavam dicas e experiências cervejeiras via internet e degustavam suas descobertas no icônico bar Frei Tucker Slow Beer, de propriedade de Luiz Flávio.
“A turma ficou conhecida pelo nome de Confraria BH. Aliás, em março daquele mesmo ano, era formada a Confraria Feminina da Cerveja – Confece, também em Belo Horizonte, por um grupo de amigas que também curtiam boas cervejas. Quando os conheci, trocamos afinidades, e apesar de não fabricar cervejas, me juntei a eles”, registra Henrique Oliveira.
Além de consumir, o pessoal também produzia suas próprias cervejas em casa e as compartilhavam com amigos e convidados. A idéia evoluiu para o I BH Home Bier – Mostra de Cervejas Caseiras de BH, realizada no Frei Tuck com o apoio da Falke Bier e da distribuidora Bier Wein. Foram avaliadas cerca de dez cervejas e premiadas as três melhores, produzidas por Thomas Karpen, José Augusto Silveira e Daniel Teixeira Chaves. O evento lotou o lugar e o seu sucesso levou à realização de mais quatro edições.
Inspirados nas associações de cervejeiros artesanais do Rio de Janeiro e São Paulo, em outubro de 2007 alguns cervejeiros caseiros de Minas se reuniram na casa do pai de Henrique Oliveira, para criar entidade semelhante no estado, a Acerva Mineira. O número de associados cresceu rapidamente, assim como o volume da produção de cervejas caseiras, sob a orientação do mestre Paulo Schiavetto.
Por meio da associação, os cervejeiros faziam compras conjuntas de ingredientes, como malte, lúpulo, levedo e alguns equipamentos de menor porte, como chopeiras, cilindros e conexões. Já havia um certo clima de empreendedorismo. Uns passaram a palestrar e dar aulas sobre cervejas, outros decidiram se dedicar à cerveja como profissão. Entre eles, Felipe Viegas da Taberna do Vale, Alencar Barbosa (Cervejaria Küd), Paulo e Geraldo Furst (Fürst Bier); Daniel Pinheiro, Humberto Mendes, Paulo Patrus e amigos (Cervejaria Inconfidentes), Alfredo Figueiredo e Marco Antônio (VM Beer), Normado Morg (Cervejaria Uaimií), Cristiam Nazareno (Cerveja Profana, de Juiz de Fora), Bernardo Gosling (Gosling Beer).
Pablo Carvalho, Rodrigo Parisi, Kelvin Azevedo e Rafael Patrício se tornaram grandes profissionais cervejeiros. José Bento Valia Vargas montou uma distribuidora de insumos e cervejas. João Becker se tornou dono de um bar famoso em Ribeirão Preto, Armando Fontes se tornou designer especializado em rótulos. “O movimento cultural e empresarial relacionado à cerveja então explodiu de vez, com a Acerva Mineira se tornado uma incubadora de talentos”, contou Henrique Oliveira.
Tendo se integrado depois ao grupo dos pioneiros, a jornalista Fabiana Arreguy, da CBN de Belo Horizonte criou o programa Pão e Cerveja, contribuindo para difundir a cultura da cerveja de qualidade em Minas. Por meio do Extra-Malte, o músico Sady Homrich também foi importante nesse aspecto, assim como Carol Patrus, da distribuidora Mamãe Bebidas.
Em razão da qualidade das bebidas produzidas pelo seu setor artesanal, Minas Gerais passou a ser conhecida como a Bélgica brasileira, fama advinda da criatividade dos seus cervejeiros. A Acerva Mineira teve, ainda, participação importante na qualificação de associados para obter a certificação de juízes do BJCP (Beer Judge Certification Program), tornando o maior estado do Brasil em representatividade nas mesas julgadoras de concursos internacionais.
Em seu livro, Henrique Oliveira, registra ainda que, ao longo de décadas, Minas sempre teve destaque no setor cervejeiro graças ao esforço de seus empresários. “Desde o surgimento da primeira cervejaria mineira, em 1841, e a decadência do segmento, logo após a crise americana de 1929, guerreiros como Felício Brandt, Hermógenes Ladeira e Luiz Otávio Possas Gonçalves mantiveram a luz acesa durante as décadas de 1960 a 1990, enfrentando o poderio da Brahma e da Antárctica”.
“Luiz Otávio, o último daquela velha guarda, resistiu até 1999, quando essas duas empresas se uniram após aprovação do CADE”. Mesmo após aquela derrocada, quase que mortal, o candeeiro do micro produtor foi sabiamente repassado em 1997 para Herwig Gangl, Teodósios Tersis, Rodrigo Ferraz e Marcus Brodnik, quando resolveram fundar a Cervejaria Krug Bier. Simultaneamente, naquele mesmo ano, os irmãos Halim e Munir Kalil e Paula Lebbos, incrementavam os seus negócios com a criação da Cervejaria Bäcker”, destacou o autor.
Henrique Oliveira enxerga o cenário cervejeiro artesanal de Minas em franco crescimento, tanto no número de empreendimentos e como pela ousadia dos produtores. “Minas Gerais possui um forte apoio institucional por parte de entidades como a Acerva Mineira, o SindBebidas e a Codemig”. Para ele, os governos vêm compreendendo que o micro produtor de cervejas não pode ser sufocado com altas taxas tributárias.
“Mas, o futuro requer cautela. As micro cervejarias, para se manter num mercado concorrido e monopolizado por grandes fabricantes, precisam de um bom planejamento, estratégias adequadas, atenção ao fluxo de caixa, atendimento primoroso a clientes e, acima de tudo, racionalização de custos. Fábricas, mesmo que pequenas, requerem ganhos de escala, investimentos constantes em manutenção e ampliação, excelência em seu gerenciamento”, aconselhou.
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