Menos sede, menos lucro
Após uma década de alta, o consumo de cerveja estacionou no
Brasil desde 2011 e já afeta os resultados de empresas como a Ambev. Para as
cervejarias, o cenário está dado: é preciso lucrar mais com menos litros
Por Ana Luiza Leal
São Paulo - Fabricantes de cerveja não estão acostumados a
ouvir más notícias sobre o mercado nacional. Os brasileiros não estão entre os
maiores beberrões do mundo, é verdade — aqui o consumo por pessoa, na casa dos
60 litros por ano, é menos da metade de países como a República Checa. Mas, na
última década, as vendas avançaram quase 60%, e o país virou o terceiro maior
mercado mundial do produto, atrás apenas de Estados Unidos e China.
De um lado, a base da pirâmide trocou a cachaça pela
cerveja. De outro, quem tem mais dinheiro passou a comprar marcas mais caras.
As perspectivas, até bem pouco tempo, eram as melhores possíveis. Mas, de dois
anos para cá, a sede do brasileiro está deixando a desejar.
Segundo a empresa de pesquisa Nielsen, o consumo caiu 0,9%
em 2011, 0,8% em 2012 e até abril deste ano tinha recuado 6%. Um tombo dessas
proporções não era visto há pelo menos duas décadas.
A líder Ambev, que tem 69% do mercado, foi a principal
vítima. Para surpresa de analistas e investidores, os volumes da empresa caíram
8% no primeiro trimestre deste ano e 0,4% no segundo — o último resultado,
aliás, foi recebido com alívio pelo mercado, que esperava redução de 3% (as
ações chegaram a valorizar 5% no dia do anúncio).
A queda afetou a grande fortaleza da companhia — sua
capacidade de aumentar a margem de lucro em quaisquer cenários. No segundo
trimestre, o lucro caiu 1,1% sobre o ano anterior, para 1,8 bilhão de reais.
Para uma empresa que acostumou seus investidores a boas notícias, reverter a
queda virou prioridade.
“A principal dificuldade é a impossibilidade de aumentar os
preços sem que isso se traduza em nova queda de vendas”, afirmou, em relatório,
Alexander Robarts, analista do banco Citi. Se não atingirem a meta, os 11
diretores correm o risco de ficar sem 52,5 milhões de reais em bônus — o que
dá cerca de 8 milhões de chopes Brahma. Procurada, a Ambev não deu entrevista.
O brasileiro está bebendo menos. Primeiro, por uma série de
questões conjunturais. Até o último Carnaval, mais chuvoso do que a média,
entrou para o rosário de lamentações. A Lei Seca e os arrastões em bares e
restaurantes também estão entre os motivos. O movimento em bairros boêmios,
como Vila Madalena, em São Paulo, chegou a cair um terço.
A classe C também está com o bolso apertado. Apesar de o
Brasil viver um período de pleno emprego, o número de famílias que se
declararam endividadas atingiu 65% em julho (o segundo maior resultado da série
iniciada em 2010), de acordo com pesquisa da Confederação Nacional do Comércio.
Ao mesmo tempo, o preço da cerveja não para de aumentar. No
segundo semestre de 2012, a Ambev — e, na esteira, as concorrentes — subiu o
preço 20% por causa do aumento de impostos. O governo decidiu, no ano passado,
aumentar 25% a taxação da bebida até 2016. Para piorar a situação, metade do
custo de produção da cerveja é atrelado ao dólar, que valorizou acima do
esperado.
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