terça-feira, 5 de abril de 2016

HB em BH o retorno

Sócios da Hofbräuhaus contam o que deu errado na implantação da cervejaria


“Teve gente falando que fechamos porque acharam um dedo na salsicha. A gente ouve várias coisas. Fechamos porque ficamos sem cerveja. Simples assim”, afirma Bruno Vinhas, de 28 anos. Ele é um dos sócios à frente da filial da cervejaria alemã Hofbräuhaus em Belo Horizonte (a primeira aberta na América Latina), cuja aguardada inauguração, em novembro passado, transformou-se num legítimo pesadelo. Vendeu-se muito mais cerveja do que o esperado e a casa foi fechada apenas dois dias depois da abertura, funcionando por mais 19 dias com capacidade reduzida. Reaberta recentemente, passa por reforma para aumentar a produção da bebida.

Nas redes sociais, ele e seus sócios – Henrique Rocha, de 29, e Francisco Vidigal, de 28, foram massacrados. “Eu chegava triste para trabalhar. Cheguei a parar de olhar o Facebook”, confessa Vinhas. Somado a isso, há o fato de serem jovens sem qualquer experiência na área, tendo levantado o empreendimento de R$ 9 milhões graças ao “paitrocínio” de um deles. Aliás, a reforma necessária para reabrir a cervejaria custou mais R$ 1 milhão ao projeto. “São motivos a mais para as pessoas falarem de imaturidade, amadorismo e tal”, diz Vinhas.

Ele mesmo assume: “Subdimensionamos. Por mais que tenhamos nos baseado em dados, o erro foi nosso. Uma empresa fez análise do mercado atual e com ela alimentamos a matriz, lá em Munique, na Alemanha. Com uma penca de dados na mão, mandaram de lá a estimativa de consumo de cerveja por pessoa, que era de 700ml. Eles não conhecem esse mercado, não iam acertar. Foi melhor recuar e arrumar o que estava errado”. Detalhe: a casa serve a bebida, sua especialidade, em canecas de até 1 litro.

Não seria um número baixo esse de 700ml? “Você vem com alguém que não bebe ou que bebe pouco, por exemplo. Então, é uma média razoável. Além disso, aqui é um restaurante e vamos mudar essa visão centrada na cerveja”, responde Vinhas. Vidigal, seu sócio, completa: “Para a matriz, o chamariz é a atmosfera, não a cerveja”. A média de consumo da bebida, que chegou a ultrapassar 2 litros por pessoa na inauguração (quando a fila de espera chegou a três horas), está em 1,6 l e deverá estacionar em 1,4l.

“Todo dia tinha gente vomitando no banheiro. O clima que temos é de Oktoberfest. A gente gosta dessa animação, todo mundo sai daqui com sorriso no rosto. Só não precisa vomitar”, observa Vinhas. A produção, que fica no mesmo imóvel e é feita diante da freguesia, foi redimensionada para atender à média de consumo de 1,8l por pessoa. Para isso, encomendaram mais tanques de fermentação (que levaram cerca de 45 dias para ficar prontos), ampliando o volume total deles de 12 mil para 26 mil litros.

Processos na fabricação da cerveja também foram aperfeiçoados, encurtando a produção da bebida de 40 para 25 dias – sem descaracterizar o produto final, garantem eles, que precisa ser o mais fiel possível ao que é servido em Munique. O resfriamento dos tanques de fermentação, por exemplo, tornou-se mais eficiente. No momento, trabalha-se na conclusão da laje sobre os tanques novos e do isolamento térmico de tubulações. A casa produz três estilos de cerveja: helles (lager semelhante à pilsen), de trigo e dunkel (lager escura).

TRINCANDO
E não bastou: ainda foi preciso alterar a temperatura de serviço da cerveja. “Tivemos muita reclamação e precisamos adaptar. O padrão era o alemão, entre 7 e 8 graus. Reformulamos todo o sistema de refrigeração e estamos servindo a 1 grau. Tentamos fazer um meio-termo, pois o brasileiro gosta de cerveja quase congelada, a 2 ou 3 graus negativos. Fazemos cerveja como a de Munique e não a serviríamos tão fria a ponto de não ser possível sentir seu sabor. É uma cerveja agradável de beber, mas não vem trincando”, diz Vinhas.

Ele assegura que o incidente não gerou mal-estar entre franqueados e matriz e que, a partir disso, descobriu que não estava só: “Fizemos estudo de mercado, mas o planejamento veio baseado na experiência deles com outras franquias. Depois é que descobrimos que não foi a primeira vez que tiveram de fechar uma franquia. Foi a segunda ou terceira vez”.

Os novos tanques começarão a ser usados nas próximas semanas e a previsão é de que a cervejaria volte a funcionar com horário normal (de terça a domingo) no fim do mês que vem – por enquanto, abre apenas de sexta a domingo. O cardápio permanece inalterado, com clássicos germânicos (joelho de porco, salsichão etc.) e o mesmo pretzel que se come em Munique (ele é trazido de lá congelado). “Errar uma vez o pessoal perdoa. Duas não dá”, resume Vinhas. Sorte ou não, a casa tem ficado constantemente cheia.

Bruno Vinhas conta que ele teve a ideia de trazer a cervejaria para a capital mineira sete anos atrás, quando viajava pela Alemanha. “Comecei a ligar para o restaurante mesmo, pois não tinha os nomes dos diretores”, conta ele. No ano seguinte, voltou ao país europeu para uma viagem de “mochilão”. “De repente, recebi e-mail para marcar reunião. Não tinha roupa nenhuma. Comprei uma blusa social, uma pasta de couro, enchi de papel em branco e fui para a reunião. Um amigo meu também foi para me dar apoio moral”, lembra.

Ele diz que, naquela época, usava cabelo grande e seu visual não causou boa impressão nos alemães. Mesmo assim, as negociações prosseguiram e, seis anos depois, o contrato foi assinado. Os jovens mineiros tornaram-se, então, proprietários da master franquia da Hofbräuhaus no Brasil, o que significa que tudo o que envolva a marca por aqui deverá passar por eles. Não por acaso, o trio planeja abrir mais 10 unidades da cervejaria até 2035.

Originalmente, conta Vinhas, a intenção era abrir a casa antes da Copa do Mundo. “Tive problemas com o alvará na prefeitura. Pedi alvará de reforma e só me deram depois de insistir bastante. Já havia passado a Copa e fiquei um ano parado, pagando aluguel”, lembra. As obras duraram um ano e, antes que terminassem, BH havia ganho a incômoda fama pela derrota do Brasil para a Seleção Alemã por 7 a 1, no Mineirão.

Didatismo de mestre
Nos bastidores, muito se falou sobre a escolha do mestre cervejeiro da Hofbräuhaus, Carlos Henrique Vasconcelos. Ele é formado em biologia, dá aulas sobre cerveja e atua profissionalmente no ramo há apenas dois anos, tendo prestado consultorias para as cervejarias VM Beer e Krug Bier. Inicialmente, ele não havia sido sondado para o cargo e seu currículo só seguiu para análise na Alemanha porque, coincidentemente, esteve no local para tentar parceria como professor. “Eram salários e experiências diferentes. No caso dele, gostamos muito da sua alma didática e de ser proativo”, diz Bruno Vinhas, um dos sócios da casa.

Todo o planejamento de produção da cervejaria já estava definido quando Vasconcelos chegou, tendo participado apenas de sua implantação. “O equipamento que temos aqui é extremamente singular, importado da Alemanha. A fábrica dele, Kaspar Schulz, tem mais de 300 anos. É muito bom, muito experimentado, mas extremamente raro no Brasil. Somos a quinta cervejaria no Brasil a operar com equipamento desse. Ele dá aferição, controle e padronização absurdos no processo”, afirma Vasconcelos. Paralelamente, Paulo Schiaveto, também mestre cervejeiro, foi chamado nesta segunda fase para redimensionar e otimizar a produção.

Palavras minhas: Agora eu vou lá!

Fonte: Estado de Minas

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