segunda-feira, 13 de maio de 2024

Trabalho Voluntário em meio a crises

Andrew Dolph/Times Reporter
Andrew Dolph/Times Reporter

A importância do voluntariado no tratamento da gestão de crises

 por Henrique Oliveira (*)

Em 1993, participei de um programa de intercâmbio no interior do estado de Nova Iorque. A região, conhecida por Allegany County, possuía como risco climático as baixas temperaturas decorrentes das fortes nevascas. O rigoroso período de inverno colocava toda a comunidade em estado de emergência, tendo em vista que as estradas eram bloqueadas por elevados maciços de neve. Esse evento natural impedia a polícia, o SAMU, os bombeiros ou ainda da defesa civil em chegar em locais distantes para salvar possíveis vítimas, sobretudo em casos de incêndio. As moradias americanas são construídas, em geral, com materiais extremamente inflamáveis, como madeira, isolantes térmicos à base de fibra de vidro e assoalhos sintéticos e carpetes. Para manter a casa aquecida, aquecedores elétricos ou a gás são utilizados ao máximo, provocando um efeito estufa, rico em ar seco. Acrescido de pó e sujeira em suspensão, o risco de incêndio se torna iminente. Basta acender um palito de fósforo ou ainda um fogão a gás com faísca elétrica que o risco de explosão pode se tornar um evento desastroso. Quando ocorria um incêndio em plena nevasca, o sofrimento da família que se encontrava em vulnerabilidade provavelmente era cicatrizado por um grupo de voluntários que estavam mais próximo daquela residência.

Me lembro que cada voluntário recebia do Corpo de Bombeiros um treinamento de combate a incêndio e primeiros socorros, bem como um conjunto básico de equipamentos como pá, picareta, machado, cabos de aço, lanternas e roupas especiais. Havia também um rádio comunicador ligado diretamente com a polícia local, o que facilitava a rápida comunicação entre as unidades de salvamento. Além disso, voluntários que possuíam caminhonetes, tinham a permissão de instalar um giroflex azul no teto da cabine, facilitando a sua identificação e dando a este civil prioridade em transitar em rodovias e seus acostamentos, bem como ter acesso as áreas de risco. Os voluntários eram vistos pela comunidade local e pelas instituições de governo com enorme orgulho, com dignidade e respeito.

A menos de um mês, o Rio Grande do Sul vem sofrendo com riscos climáticos decorrentes das fortes chuvas. Diversas pessoas, de forma voluntária, partiram para aquele estado munidos de motos aquáticas, barcos e lanchas para salvar vidas. Houve ainda aqueles que decidiram ir com veículos equipados, jipes, quadriciclos e carretas para regaste ou ainda levar mantimentos e itens de primeira necessidade. Empresários, em solidariedade, cederam aeronaves e helicópteros buscando propiciar o socorro imediato. Surpreendentemente, fontes jornalísticas noticiaram que o governo, em suas diversas esferas, seja por incompreensão ou despreparo, retaliou algumas caravanas que se encontravam a caminho do ponto de combate. Houve supostos casos de apreensão de veículos e equipamentos, burocracia fiscal ou ainda multas rodoviárias sem sentido. (Desvios estes que, em sua maioria, foram reconhecidos e que serão reparados a posteriori.) Entretanto, apesar desses entraves, o pior cenário foi o estado ter dificuldade em reconhecer, ou talvez, dar a devida importância do trabalho voluntario, aquele que estava muito à frente na linha de resgate, retardando o processo. Não cabe entrarmos no mérito político, mas o que se observa é uma clara desconexão entre o poder público e os voluntários da pátria. E não me refiro somente à esse caso em específico ocorrido no sul. Outros eventos de crise, como os recorrentes desmoronamentos em Teresópolis e Petrópolis, no Rio de Janeiro, e enchentes em outros estados, como Minas Gerais e o sul da Bahia, houve uma demora no alinhamento de governo para com os voluntários.

É nítido que, cenários de desastre, quando ocorridos e tomados em conjunto em uma região, se tornam uma catástrofe. O poder público e as autoridades não dão conta sozinhos do recado. Todos, incluindo a sociedade civil, devem colaborar. (A exemplo, empresas de médio e de grande porte, contam, além do bombeiro civil, com brigadistas voluntários, capazes de orientar empregados e terceiros a evacuarem um edifício ou ainda atuarem como membros de primeiro combate e resgate. Trata-se de uma extensão de linhas de defesa.) Nessas circunstâncias, toda ajuda é essencial. Em situações graves, órgãos de governo tem que contar com mais suporte da sociedade e do setor privado. É uma questão de humanidade e bom senso. Senso de solidariedade, que não pode ser coibido ou ainda aceito de forma tardia, tampouco limitada.

Segurança Empresarial/Itaipu

Nesse cenário, quem tarda pode aumentar o risco de falhas. Consequentemente, conclui-se que, órgãos e instituições de defesa passaram da hora de executar benchmarking externo (em outras instituições semelhantes em outros países) buscando formar e aumentar grupos de voluntários éticos, com plena disposição em atuar em casos críticos. Para tanto, deve-se capacitá-los e guarnecê-los com o mínimo de infraestrutura. Além disso, devem considerá-los como membros efetivos de uma equipe, de um comitê, que participam do planejamento estratégico e que se encontram hábeis para atuar quando houver cenários “de guerra”. Essa dinâmica, permite e agiliza a capacidade de ação de defesa e acesso em locais mais remotos, onde o poder público ainda não avançou.

Apesar do país de haver muita solidariedade entre os cidadãos, é necessário desenvolver voluntários qualificados pelas entidades de defesa. De forma, a gestão de crises será uma ferramenta de mitigação de riscos mais ágil e eficiente.

A propósito: o município onde estudei no estado de Nova York, conta com, aproximadamente, 30 voluntários, além do bombeiro oficial, para uma população mil habitantes. O time está habilitado o suficiente para manipular ambulâncias e carros de combate a incêndio e de resgate. Alunos da escola municipal podem concorrer a bolsa de estudos no Departamento de Bombeiros.

É um benchmarking a ser explorado.

Saiba mais em: https://alleganyhopewny.org/locations/bolivar-fire-department/

https://fire.fandom.com/wiki/Bolivar_Volunteer_Fire_Department_(New_York)

https://www.wadsworth.org/node/513120/printable/print

https://www.timesreporter.com/story/news/local/2022/08/23/community-helps-bolivar-celebrate-new-fire-truck/65415728007/

https://www.defesacivil.rs.gov.br/seja-um-voluntario

(*) - Henrique Oliveira é Consultor Executivo de Governança, Riscos e Compliance

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