O
MERCADO DE CERVEJAS NO BRASIL:
o momento é de observação.
Por Henrique Oliveira
Se eu pudesse deixar uma daquelas frases de efeito normalmente
provenientes de pessoas famosas, diria o seguinte: "O mercado é um
comportamento humano. É reflexo do que as pessoas desejam em um determinado
momento, utilizando a moeda e o escambo como fontes de troca e
representação".
O mercado de cervejas no Brasil vem, na ultima década,
apresentando aquecimento de produção e consequente consumo. De 2003 a 2012 o salto da
produção foi da ordem de 61%, passando de 8,5 bilhões de litros/ano para 13,7
bilhões. A expectativa para 2017, segundo estudos da empresa pesquisadora de
mercados Mintel Group, é que a produção atinja a casa dos 15 bi. O primeiro
termômetro apontado - fato consumado - é o poder financeiro de compra do
brasileiro que evoluiu nesses dez anos face ao incremento da sua renda. A
exemplo disso, lembro-me do caseiro do meu sítio e meu amigo de infância,
Ronaldo Pinto, que tem o prazer em poder pagar-me uma cerveja, sempre dizendo:
" - Deixa que eu pago essa, patrãozinho, pois agora eu posso!". Adicionalmente,
a estabilidade cambial, equivalente ao poder de presumir "quanto valerá o
dólar no dia seguinte", também foi fator preponderante para o crescimento,
uma vez que as oscilações da moeda estrangeira ficaram mais estáveis
aprimorando o planejamento econômico-financeiro das empresas produtoras de
cervejas. Matérias-primas como malte, lúpulo e levedo e equipamentos em aço
inox são normalmente indexados em dólares, o que compete estudos mais apurados
de caixa e investimento. Toda estabilidade, nesse caso é deveras bem-vinda. A
inflação, após décadas, atrofiou-se atingindo níveis de um dígito.
Outro fator é que novas marcas e empresas do ramo cervejeiro
ingressaram no país com o intuito de atuar fortemente no mercado disponível.
Logo após assistirmos o movimento Ambev, presenciamos a aquisição da japonesa
Kirin sobre a Schincariol e da holandesa Heineken sobre a Fomento Mexicano S/A
– FEMSA do Brasil, ora dona da marca Kaiser. O aumento estrutural do segmento
foi também acompanhado pela inserção aproximada de 200 microcervejarias ao
longo do mesmo período. O consumidor pôde observar uma diversificação do mix de
consumo e de produtos com estilos variados de cervejas e em diferentes
embalagens (despertando a curiosidade gastronômica) assim como observou uma
diversificação da distribuição, algo aparentemente “novo” no mercado
cervejeiro, oferecendo mais meios de acesso a gama de produtos.
Renovou-se o marketing, surgiram as vendas de cerveja
on-line, clubes de assinatura de cervejas, associações e confrarias cervejeiras,
homebrewers ou cervejeiros caseiros, cursos profissionalizantes em geral, lojas
especializadas, novos eventos nacionais de cervejas, além de bares e
restaurantes focados em cervejas premium e cardápio gourmet. Livros sobre
cerveja e seus derivados citam práticas de harmonização, fabricação, turismo,
entre outros, e estão à tona para dar mais informação ao consumidor. O que se conclui é que toda cadeia produtiva
do segmento cervejeiro está trabalhando bastante, em um curto espaço de tempo,
para preservar valor e manter o ritmo de crescimento.
Não obstante, o governo participou do processo. Majorou os
impostos, compensou parte dos incentivos fiscais de outros setores no segmento
de bebidas, e informatizou o sistema de recolhimento fiscal, com direito a
antecipação do tributo logo após o seu envase – a chamada Substituição
Tributária (ST).
QUEDA NAS VENDAS EM 2013
Muito se comenta sobre a queda de consumo no mercado de cervejas
no cenário atual. O que se observa nesse final do terceiro trimestre de 2013 é
um pedido de folego por parte do consumidor final para com o seu poder de
compra que viu os preços subirem para níveis menos confortáveis de pagamento,
num âmbito geral. A corda no pescoço apertou ainda mais para o setor
cervejeiro, com a mudança de comportamento desse cidadão; as leis Seca e do
Silêncio reduziram a frequência do “consumo
de celebração”, migrando esse gradativamente para o “consumo de relaxamento”. Explico
melhor: antes tomava-se cerveja no bar celebrando com os amigos mais vezes por
semana, e agora se toma cerveja em casa, relaxando sozinho e por conta própria.
A celebração, sem sombra de dúvidas consome mais tempo, bebida e dinheiro. Já
em casa, o consumo atinge patamares mais moderados, a preços módicos...e com
mais segurança, tendo em vista os arrastões ocorridos em bares e restaurantes
destacando as grandes metrópoles como São
Paulo, com mais de 35 casos nos últimos 6 meses.
Por fim, o câmbio não está mais estável como antes, afetando os
preços das commodities que envolvem a cerveja e deixando os produtores menos
assertivos quanto ao planejamento futuro. A inflação, acumulada com base no
índice IPCA que ronda os 6,3 pontos percentuais nos últimos 12 meses também fez
parte desse estresse e essa surge nas “pequenas coisas” que majoram os outros
índices oficiais e pioram a percepção e o comportamento do consumidor.
Alimentos e bebidas acumulam um aumento na casa dos 24,6%, segundo dados relacionados
ao índice.
Por mais que esses desvios sejam pontuais, os fatos não ferem como
um todo, o desempenho do segmento. O momento atual é marcado pela sazonalidade
(o inverno foi mais rigoroso atingindo inclusive regiões tradicionais de clima
quente), eventos esportivos como a Copa das Confederações reduziram os impactos
em contra-partida, ou seja; o timming é muito curto e as variáveis são muitas e
complexas para se ter um diagnóstico efetivo da situação. Não obstante, tendo
em vista que o mercado de cervejas é um dos mais importantes do país, qualquer
movimentação adversa sempre cabe atenção e cautela. Vamos ver o comportamento
humano nos próximos meses, pois nas circunstâncias, o melhor é observar para
melhor planejar. Ainda não há água no chope, mas talvez ele esteja esquentando.
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