"Ciganas", as cervejas que vivem de aluguel
Os amigos Bernardo Couto e Salo Maldonado, três anos improvisando cerveja em garrafões de plástico, garrafas PET, panelão de feijoada e isopores, lançaram em janeiro seu primeiro rótulo comercial, engarrafado. Como grande parte das artesanais brasileiras, a carioca Hi5 tinha a missão de desviar das pilsen e weizen exploradas pela indústria. Cumpriu. É lupulada e amarga como as India Pale Ale, um estilo criado na Inglaterra do século 19, mas caramelada, escura como as "schwarzbier" alemãs. E, não bastasse ser híbrida, é nômade também.
Os mil litros de chope da primeira batelada da Hi5 foram feitos na fábrica da Cervejaria Allegra, zona Oeste do Rio, e distribuídos para oito bares - no Rio, em São Paulo, Porto Alegre (RS) e Gramado (RS). Neste mês, a produção, agora de 2,5 mil litros, migrou para São Paulo. Localizada no município de Socorro, a 140 quilômetros da capital, a Cervejaria Magnus, diz Couto, tinha melhor capacidade para atender à demanda maior. A terceira leva ainda não tem origem certa - o que não angustia os cervejeiros. "Podemos nos concentrar em desenvolver a linha de produtos e pensar melhor na estratégia de marketing", diz Couto. Ele é jornalista e Maldonado, sócio da distribuidora Infusion e do bar Beer Jack, em Botafogo. Como eles, muitos dos criadores de rótulos artesanais brasileiros são "hobbistas", dedicam-se à cervejaria nas horas vagas.
"Ciganas" do Brasil
David Figueira, presidente da Associação dos Cervejeiros Artesanais de São Paulo (Acerva paulista), estima que o custo de instalação de uma planta com capacidade inicial entre 20 mil e 40 mil litros por mês chega a R$ 2 milhões, incluindo gastos com equipamentos, que equivale a um quarto do total. O retorno, ele diz, vem em seis ou sete anos, em média.
Com o fortalecimento das entidades representativas do setor, especialmente as Acervas, cresceu o número de "hobbistas" dispostos a empreender. Na outra ponta, as microcervejarias têm encarado o aluguel da fábrica como forma de amortização de seu investimento inicial. Nos últimos cinco anos, seis associados da Acerva de São Paulo e oito do Rio começaram a produzir em escala comercial - e em plantas terceirizadas. Lúcio Fialho, presidente da Acerva carioca, acredita que o número deve ganhar força nos próximos anos. "Nacionalmente, temos hoje 500 associados, metade do número de cervejeiros da grande Chicago. Nos Estados Unidos [referência no segmento artesanal], existem 30 mil".
Apesar de mais difundidos, os rótulos "ciganos" também são recentes em países da União Europeia e nos Estados Unidos. Pioneiro e grande entusiasta da cervejaria itinerante, Mikkel Borg Bjergsø começou a produzir em 2006, na sua Dinamarca natal, país da gastronomia "cabeça aberta" e do melhor restaurante do mundo, o Noma. A Mikkeller, do cervejeiro, já lançou de pilsen à Beer Geek Bacon, feita com malte defumado e café.
Ainda que incipiente, completa Fialho, o avanço dos rótulos "ciganos" e a tendência de terceirização no setor, além de ampliar exponencialmente a variedade de rótulos, tende a "reorganizar a cadeia" e o mercado, oligopolizado por grandes fusões.
Fonte: Jornal Valor 25.05. 2012, página D6. © 2000 – 2012. Todos os direitos reservados ao Valor Econômico S.A.
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