Uma dose de FCPA para
a manutenção dos Programas de Compliance durante os tempos de Pandemia
Os efeitos da atual Pandemia do Covid-19 têm
causado demandas urgentes em diversas frentes de atuação das empresas. O senso
de emergência tomou conta de todos. Consequência disso, novas demandas de
Compliance vêm surgindo de forma repentina, como por exemplo, o atendimento à
protocolos de Saúde e Segurança e o cumprimento às medidas ministeriais
vinculadas ao trabalho e emprego, como a MP 936, posteriormente convertida na
Lei 14.020/20. Houve ainda diversos decretos vindos das três esferas de
governo, impondo restrições de acesso e aglomerações em espaços específicos, o
que proporcionou o afloramento do uso do teletrabalho e a intensificação da
prestação de serviços via home office, além do uso de canais de vendas on-line.
Nesta vertente, indústrias reduziram o seu ritmo de produção e o comércio em
geral baixou suas portas, levando muitas empresas a um estado de calamidade,
beirando à concordata ou ainda decretando falência.
Em contrapartida, foram incrementados atos de
ajuda filantrópica, desde a doação de insumos, como máscaras, luvas, protetores
faciais e cestas básicas; de bens em geral, sobretudo destinado a saúde humana
como leitos, colchões e respiradores artificiais, e em alguns casos, doações em
dinheiro, vindas de empresas privadas com destino final às diversas entidades
filantrópicas e beneficentes, principalmente àquelas ligadas ao poder público,
como Secretarias de Saúde, Prefeituras, hospitais regionais e de campanha. É
perceptível que houve uma trégua parcial de divergências e conflitos entre os
poderes público e privado, em prol da mitigação dos efeitos do Corona Vírus. As
doações, surpreendentemente, devem se aproximar aos 10 bilhões de Reais. A
população é parte integrante desse processo, buscando agir com segurança,
muitas vezes se isolando em casa, apresentando um ato de civismo.
Mesmo havendo um universo de boas intenções,
práticas de boa-fé e solidariedade no presente momento, há ainda aqueles que
aproveitam a oportunidade de uma crise para causar danos ao mercado, ao ente
público, à população e, consequentemente, à pátria: superfaturamentos, desvios
de verbas, roubo de bens e equipamentos, bem como atos de apropriação indébita.
Além de ser desumano, esse conjunto de atividades retratam uma intensificação
dos riscos de corrupção recorrentemente praticados. Diante desse cenário
perturbador e destrutivo, a governança, a avaliação contínua de riscos e o
estar em Compliance não podem ser colocados para depois, ou quando o “novo
normal” emergir.
É nesse cenário, variante entre bona fides e
maledicências, entre agentes dos setores privado e público, que o Departamento
de Justiça Norte Americano (DOJ – Department Of Justice) oportunamente relançou
o seu “Guia de Recursos para Lei Americana Anticorrupção no Exterior”, mais
conhecida pela sigla “FCPA – U.S. Foreign Corrupt Practices Act”, editado em
novembro de 2012.
Publicada em julho de 2020, esta segunda
edição, além apresentar um apêndice da Lei em sua íntegra, o guia se divide em
10 capítulos que abordam temas relevantes tais como: as disposições ou
cláusulas antissuborno, as providências quando aos registros contábeis e
correspondentes controles internos; outras leis americanas que são afetadas por
práticas contra o FCPA e a Comissão de Valores Mobiliários americana (SEC);
penalidades, sanções e práticas de remediação; canal de denúncias; um parecer
sobre condutas do DOJ como ferramenta de orientação a serem seguidos por
empresas, em consonância ao FCPA e; “Princípios de Execução” – esse item, ao
meu ver, um dos mais relevantes, pois apresenta diversas características
determinantes para formação e manutenção de um efetivo programa de Compliance.
Visto o cenário socioeconômico atual, programas de Compliance devem ser
considerados prioridade na agenda da Alta Administração visando, a sua efetiva
manutenção e eficiência. Um efetivo programa, conduzido por um tom vindo de
cima (“tone at the top”), aumenta a cultura de integridade em toda a organização,
conscientiza pessoas e parceiros por meio do exemplo e de treinamentos e ainda
alivia a empresa e seus empregados dos riscos de penalidades, multas e sanções,
(incluindo as de natureza criminal), decorrentes de uma falha significativa ou
ainda de um desvio de conduta em particular.
Durante
a leitura dos capítulos do Guia de Recursos, é notória a menção de situações
hipotéticas exemplificadas pelo Departamento de Justiça, com o seu respectivo
ponto de vista. Adicionalmente, são citados casos verídicos de práticas de
suborno e corrupção que ocorreram entre diversas entidades privadas e agentes
públicos ao redor do mundo, incluindo empresas brasileiras e estrangeiras com
filiais no Brasil, sobre o ponto de vista desse Departamento e da SEC. Há ainda
a intensificação de conceitos e termos já conhecidos pelo meio, a apresentação
de tipos de pagamentos permitidos e outros considerados impróprios; o
detalhamento sobre situações de responsabilização sucessória; procedimentos de
auto-denúncia; práticas de cooperação com as entidades regulatórias e a
prontidão à remediação em caso de ocorrências, incluindo a inserção de um
programa efetivo de integridade.
Aos profissionais do setor, sobretudo membros
participantes de conselhos, comitês de riscos, integridade e ética, advogados e
contadores, ainda aqueles que exercem suas funções em empresas que de certa
forma são associadas ao Mercado de Capitais americano, recomendo a leitura da
2ª edição do Guia de Recursos para o FCPA, consultando tempestivamente ao longo
dos textos, as “Notas Finais”, contidas no último apêndice.
Face as más condutas de alguns, os riscos de
associação indevida e a responsabilização sucessória, todo cuidado é pouco. Uma
dose de FCPA é sempre bem-vinda, principalmente neste cenário pandêmico. Merece
reflexão e ação, de forma a manter a reputação intacta, sem perder em foco.
Saiba mais
e acesse o Guia em:
https://www.justice.gov/criminal-fraud/file/1292051/download e https://www.sec.gov/spotlight/fcpa/fcpa-resource-guide.pdf
Sobre
exemplos de desvios de conduta durante a pandemia: https://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2020-05/pf-investiga-superfaturamento-de-respiradores-em-fortaleza
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