Coleção reúne obra completa de Padre Antônio Vieira
Uma em cada quatro linhas da
obra completa do padre Antônio Vieira, reunida na coleção de 30 volumes
publicada pela Edições Loyola, é rigorosamente inédita. Parece inacreditável,
mas o projeto concretizado pela editora, que será apresentado nesta quinta-feira,
9, a partir das 18 horas, na Academia Paulista de Letras, com a presença do
presidente da instituição, Gabriel Chalita, tem vários textos de Vieira nunca
publicados - e que correspondem a um quarto das 13.450 páginas da coleção agora
concluída.
A coleção é lançada quatro séculos depois da
morte de Vieira, o jesuíta visionário que, no século 17, ousou desafiar a
Inquisição, defendeu os índios, lutou contra a escravidão - traçando uma
analogia entre as condições sub-humanas dos negros africanos e o calvário de
Cristo - e ainda se insurgiu contra a perseguição aos judeus pelo governo
português. É provável que novas publicações venham a jogar mais luzes sobre
esse homem, avançado demais para o tempo em que viveu - afinal, até mesmo o
historiador José Eduardo Franco, um dos coordenadores da coleção ao lado de
Pedro Calafate, admitiu a possibilidade de existir um ou outro texto raro não
localizado. Vai ser difícil, mas não impossível.
Os especialistas portugueses (37) e
brasileiros (15) que vasculharam a obra de Vieira em dez países (Portugal, EUA
e Holanda, entre eles) não deixaram passar nada nas diversas áreas em que o
jesuíta atuou - história, filosofia, teologia, direito, economia, literatura,
linguística, paleografia, filologia e até futurologia. A coleção completa da
Loyola inclui textos proféticos, escritos políticos, cartas, poesia, teatro e,
naturalmente, os sermões que tornaram o padre um dos autores portugueses mais
populares ao lado dos poetas Camões e Fernando Pessoa.
Vieira foi um homem globalizado antes da
existência desse termo. Por fazer parte de uma ordem jesuíta organizada e
presente em vários continentes - a Ásia incluída -, o padre tinha acesso a
informações que muitos dos seus pares desconheciam. O diálogo interclassista
com aristocratas, comerciantes, religiosos e populares fez dele um interlocutor
capaz de desafiar, por exemplo, o próprio rei de Portugal, ao defender que o
monarca não tinha o direito de interferir no poder soberano dos índios. Não
escapou de suas críticas a famigerada Inquisição, que definiu como uma
instituição pior que os flagelos da guerra, da fome e da peste. Seus sermões
eram tão progressistas que um deles, o da Nossa Senhora do Ó, foi retrabalhado
pela escritora contemporânea portuguesa Inês Pedrosa em seu livro A Eternidade
e o Desejo (Editora Alfaguara), que trata as duas palavras como sinônimos,
aproximando a aspiração metafísica a um desejo físico quando fala de uma mulher
grávida.
Acadêmicos costumam ficar escandalizados
quando autores como Inês prestam tributo ao padre, argumentando que, no fundo,
Vieira era um escravagista. Em todo caso, esses sermões, avessos ao gongorismo,
não se parecem em nada com o discurso do século 17. É curiosa a forma com que
os sermões foram poupados da destruição. Um navio corsário holandês resgatou de
uma embarcação à deriva o padre e companheiros, após uma violenta tempestade,
mas os corsários pilharam o barco, inclusive os papéis de Vieira, que depois
encarregou um emissário de buscar seus escritos em Amsterdã.
OBRA COMPLETA DO PADRE VIEIRA
Onde: Academia
Paulista de Letras. Largo do Arouche, 324.
Editora Loyola, R$ 2.500.
Lançamento nesta
quinta-feira, 9, 18h.
Fonte: As informações são do jornal O Estado de S.
Paulo.
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