quarta-feira, 20 de março de 2013

Cerveja Caseira no Brasil


Ao Ministério da Agricultura, Pecuária  e Abastecimento 
Secretaria de Defesa Agropecuária: 
Assunto: Resposta à Consulta Pública referente à Portaria nº 34, de 28 de fevereiro de 2013.

Prezados Senhores,

Por esta levamos ao vosso conhecimento, o fruto das discussões do grupo “Regulamentação da Cerveja Caseira no Brasil”, sitio <http://groups.google.com/group/regulamentacao-cerveja-caseira>, o qual atualmente possui 276 membros espalhados por todo o Pais - da região Norte a região Sul, e integrantes de fóruns e grupos regionais, bem como associações. Nosso grupo cresceu 27% desde a resposta a Consulta Publica referente a Portaria 142/2012, demonstrando o crescente interesse da comunidade cervejeira caseira sobre o assunto.

Da mesma forma que vimos com grande satisfação a submissão a Consulta Publica a “Portaria SDA/MAPA 142/2012”, mantemos nossas posições em relação a “Portaria SDA/MAPA 34/2013”, publicada no DOU pagina 21, Seção 1 do dia 28 de Fevereiro de2013. 

As Consultas Publicas são parte de um importante processo de dialogo com a sociedade e que deve ser parabenizado, pois ajuda a construir e consolidar a cultura democrática em nosso Pais. O setor de cervejas especiais está em crescimento e e muito oportuna esta Consulta Publica neste momento impar, equivalente em importância para a cultura cervejeira no Brasil, quando da vinda das primeiras cervejas com a Família Real e seu estabelecimento neste País.

Embora o mercado de cervejas especiais venha aumentando e haja na redação da Portaria no. 34/2013 uma evolução em conceitual, em nossa opinião, o texto conforme apresentado ainda mantem entraves, que podem impedir o franco desenvolvimento de uma cultura cervejeira genuinamente Brasileira, a despeito da grande biodiversidade de nosso Pais e do empreendedorismo e criatividade de nossos cidadãos.

A empresa inglesa Mintel, uma das empresas de pesquisa mais respeitadas no mundo e especializada em inteligência de consumo e produto, divulgou em 2012 o resultado de uma pesquisa sobre o mercado de cervejas no Brasil. O setor de Cervejas Premium no Brasil obteve impressionantes 18% de crescimento em 2011, mesmo período em que houve queda de 2% no volume de produção das cervejas mainstream. No sitio da Mintel, o analista Lucas Marangoni diz: “O mercado brasileiro de cerveja apresenta um paradoxo.  Por um lado, pode ser considerado bastante desenvolvido com uma das maiores taxas de consumo anual per capita da America Latina (67 litros) e índices de frequência e penetração próximos a de culturas fortes no consumo de cerveja, como o Reino Unido e EUA (com taxas de consumo anual per capita (de 65 e 75 litros, respectivamente). Por outro lado, em termos de diversidade de produtos, inovação e complexidade da categoria, o mercado brasileiro ainda pode ser considerado incipiente.” Ainda, conforme reportagem televisiva veiculada no Jornal da Globo em 26 de dezembro de 2012, o aumento no consumo de cervejas premium ou especiais de janeiro a setembro de 2012 foi de 17%, frente a um aumento de 2,6% no mercado total. 

O Grupo Pão de Açúcar divulgou, no primeiro balanço das vendas do Natal 2012, um crescimento de 104% nas vendas de cervejas especiais. Ou seja, o interesse do brasileiro em relação a cervejas especiais vem claramente aumentando nos últimos anos em um ritmo muito mais acelerado do que o próprio mercado geral do setor. Portanto, o desenvolvimento do mercado em termos de maturidade - com mais variedade, apresentando produtos mais diversificados, mais marcas, mais estilos, produtos realmente diferenciados (em oposição ao "mais do mesmo", que hoje se mostra em decadência, mas ainda aparece nas gondolas de supermercado) - é essencial. É interessante também salientar que, para a balança comercial, os produtos nacionais premium não dominam as prateleiras. O que se vê são muitas cervejas importadas ocupando o espaço - sejam elas alemãs, holandesas, checas, americanas e ate mesmo de países com pouca tradição cervejeira, como Japão e Espanha. Facilitar o acesso a produtos nacionais premium de forma competitiva ao consumidor brasileiro teria, sem dúvida, um impacto positivo, nao somente para o consumidor e produtor, mas sim para o mercado brasileiro de cervejas como um todo. Entendemos que já existem alguns produtores próprios no Brasil capazes de contribuir para isso: nano, micro e pequenas cervejarias, bem, como as cervejarias caseiras - que hoje atuam de modo informal (não confundir com os cervejeiros caseiros que produzem cerveja como hobby, para consumo próprio.)

Nesse documento, trataremos exclusivamente das propostas para a regulamentação das Cervejas Caseiras, que é o foco do nosso grupo de discussões.

1. A Cerveja Caseira e os Produtos Diferenciados ("Especiais" ou "Premium") 

Quem acompanha os grupos de cervejeiros caseiros pode notar que o objetivo principal destes produtores caseiros e a busca pela perfeição e inovação. Minimizar ou eliminar defeitos nas cervejas (diacetil, sulfeto de dimetila, acetaldeido), reproduzir e reinterpretar estilos de cervejas e buscar novos sabores através de inovações de processos ou uso de vegetais locais são parte corriqueira de seu dia-a-dia. Inclusive evitar aditivos químicos, que alterem o paladar, aroma e sanidade do produto elaborado, garantindo uma melhor percepção orgânica das cervejas. As maiores inovações, entretanto, não chegam a beneficiar o mercado consumidor, visto que a venda de cerveja caseira atualmente não é permitida. Em alguns países, como o Reino Unido e Nova Zelândia, a venda da produção de cerveja caseira é permitida desde que com a obtenção de uma licença - e entendemos que em nosso Pais, adotar tal pratica também seria interessante.

Nos últimos anos, assistimos um grande crescimento no segmento Premium, no setor de cervejas no Brasil. O aumento do poder aquisitivo do brasileiro, aliado as facilidades encontradas pelos importadores tiveram papel fundamental no desenvolvimento deste mercado ate o momento. Com a inexorável expansão deste mercado (que, segundo a Mintel, movimentou cerca de R$ 5,29 bilhões em 2011) e o decorrente aumento das importações de bebidas industrializadas, vislumbramos a real necessidade de desenvolvermos a nano, micro e pequena indústria nacional de cerveja, notoriamente no ramo Premium. Entretanto, com os recentes aumentos de impostos aplicados ao setor, os investimentos em cervejarias com foco no mercado de cervejas especiais torna-se menos atrativo que em outras áreas. Sendo assim, entendemos que seria de grande contribuição, como também salutar, acreditar na Cervejaria Caseira como forma de suprir, em parte, esta demanda e preparar espaço para no futuro virarem microcervejarias, que tão bem podem reposicionar nossa indústria cervejeira e leva-la a um maior reconhecimento internacional em termos de qualidade e diversidade. Além disso, esta medida estimularia toda uma cadeia produtiva - desde os estudos e produção de grãos, lúpulos, maltes e adjuntos ate o comercio varejista de matérias-primas e das próprias cervejas - o que, evidentemente, geraria mais empregos e ampliaria a arrecadação de impostos.

2. Propostas para a Regulamentação da Cerveja Caseira

Nas discussões ocorridas no grupo, três principais assuntos surgiram: a livre permissão para produção de cerveja caseira para consumo próprio, a flexibilização das exigências para o registro de estabelecimento e produto e a definição de limites para a produção de cerveja caseira para fins comerciais.

2.1. Livre Permissão para produção da Cerveja Caseira para consumo próprio

Entendemos que a própria diversidade cultural de nosso Pais, formada em sua grande parte por imigrantes, e um fator crucial para que seja finalmente explicitada em nossa Legislação a permissão para a produção de também da Cerveja Caseira para consumo próprio. Vemos como desnecessária qualquer fiscalização ou necessidade de registro no MAPA para tal atividade, cabendo ao município enquadrar de acordo com seu zoneamento e/ou plano de uso do solo.

2.1.1. Concursos, Festivais e Afins

Defendemos que seja permitida a organização de eventos para divulgação da cultura cervejeira - como concursos, festivais e afins - e que a entidade organizadora destes eventos contrate um Responsável Técnico e notifique o MAPA com antecedência, encaminhando uma lista de cervejeiros produtores participantes. A cobrança de ingressos para tais eventos poderia custear a contratação do Responsável Técnico, bem como a estrutura necessária para que o evento transcorra com segurança.

2.2.Flexibilização de exigências para o Registro de Estabelecimento e Produto.

Entendemos que a comercialização de Cerveja Caseira deveria ser permitida e facilitada, desde que não haja comprometimento da qualidade e segurança do produto e consumidores. Do ponto de vista técnico, a parte da qualidade e segurança poderia ser facilmente controlada através de analise sensorial. Como a produção é limitada a pequenos lotes, o risco do ponto de vista de saúde publica e ínfimo. Sendo assim, o que propomos seria uma flexibilização nas exigências para o registro de estabelecimento e produto, com a inclusão no Anexo I da Portaria no. 34/2013 do seguinte paragrafo:

"3. Registro de Estabelecimento Artesanal ou Estabelecimento Caseiro
a. Solicitação de registro de estabelecimento (Anexo IV);
b. Comprovante de inscrição no Cadastro de Pessoa Física ou Cadastro
Nacional de Pessoas Jurídicas no simples nacional;
c. Manual de Boas Práticas."

No caso, o Manual de Boas Praticas, dever-se-ia incluir: procedimentos de estocagem de matérias-primas, insumos, produtos acabados, procedimentos de limpeza e conservação do local de produção e equipamentos, e principalmente o olhar e compromisso ao destino dos resíduos gerados na produção da cerveja, para resguardar o meio ambiente, como também a saúde publica, precavendo-se contra vetores e no controle de zoonoses, sendo assim e explicito e necessário:

● o registro de lote e sua rastreabilidade,
● o registro de analista e dos resultados das analises sensoriais de cada lote
previamente a sua comercialização.

As analises sensoriais, que podem ser realizadas pelo próprio cervejeiro caseiro ou outro profissional treinado (como sommelier de cervejas ou técnico em Alimentos, por exemplo), permitem a detecção de contaminações químicas e microbiológicas; consideramos como parte fundamental na questão da segurança do produto e consumidores.

2.2.Limites para a produção de Cerveja Caseira para fins comerciais.

Fizemos um levantamento de vários dados da legislação vigente, consulta a legislação internacional, valores de consumo de água e energia para a produção em cervejarias caseiras. Levando-se em conta o consumo de agua na relação agua/cerveja, chega-se ao valor entre 4 e 6 litros de agua para cada 1 litro de cerveja produzida, observando-se inclusive a limpeza dos utensílios e do local. Já em relação aos rejeitos (resíduos sólidos), estes ficam na ordem media de 0,6 kg de bagaço do malte e trub (resto de lúpulo fervido) para cada 01 (um) litro de cerveja produzida. Essas quantidades variam conforme o estilo de cerveja produzido, contudo e confirmada em literatura de instituições como a da CETESB e em medições empíricas. Observando-se criteriosa e responsavelmente estas quantidades e relações rejeitos sólidos e efluentes líquidos (bagaço, malte, trub, e aguas servidas)/produto, entendemos que seria razoável um limite de produção caseira entre 750 e 73.000 litros anuais, para um regime diferenciado conforme proposto no item 2.2. Isso permitiria a normatização e regularização de milhares de negócios familiares, com o conhecimento do MAPA. 

Conclusão

Gostaríamos de concluir mais uma vez ressaltando a importância do cervejeiro caseiro para a inovação e diversificação do setor de cervejas especiais. Defendemos a flexibilização do registro de estabelecimento para os cervejeiros caseiros, bem como a permissão de produção de cerveja caseira para consumo próprio isenta de registro e o livre transito destes produtos para participação em concursos, festivais e eventos afins. Com relação ao destino de resíduos, defendemos que todo rejeito gerado na produção de cerveja para comercialização deve ter seu destino declarado e se possível cadastrado. Entendemos que previamente a comercialização da cerveja caseira, dever-se-á efetuar analises sensoriais para fins de controle de qualidade. Quanto aos limites de fabricação para enquadramento como cerveja caseira, defendemos um teto de 73.000 litros anuais para bares, pubs e restaurantes e limites menores conforme a infraestrutura do produtor e sua capacidade de adequação as legislações ambientais e sanitárias existentes.

Portanto, longe de nos posicionarmos a favor da venda indiscriminada de cerveja caseira, desejamos sim viabilizar a produção e comercialização responsável de produtos e, talvez o mais importante, com qualidade. Esperamos ter contribuído para uma melhor regulamentação do setor e colocamo-nos a disposição para futuros esclarecimentos e discussões.

Cordialmente,
Edson Katekawa
Eduardo Formenti Engler
Saulo Campolina Franca

Moderadores do Grupo de Discussão "Regulamentação da Cerveja Caseira no Brasil" e demais membros do Grupo de Discussão "Regulamentação da Cerveja Caseira no Brasil"

Um comentário:

  1. quais foram as consequências diretas que tivemos junto ao MAPA sobre esse assunto? Caminhamos ou não??

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